sexta-feira, 14 de janeiro de 2011

A sombra de uma escolha VIII

Cena 02:

*Prisco sozinho; Passando pela rua; Pára na frente do mendigo; É abordado por um amigo*

(Prisco) – É inacreditável a minha sorte.
(Prisco) – Belo se trilhou o meu caminho.
(Prisco) – Agora não temo mais nem a morte!
(Prisco) – Venha o que for pois não estou sozinho!
(Prisco) – Ora, quem vejo chegando.
(Prisco) – Se não é o meu amigo louco, insano.
(Prisco) – Que até mesmo o nome não ouso pronunciar.
(Amigo) – Ora, qual! Você e suas gaiatices!
(Amigo) – Sou excêntrico não louco.
(Prisco) – Cuidado com o que dizes...
(Prisco) – Excêntricos são ricos e tu ganhas pouco.
(Amigo) – Vejo que seu bom humor se elevou...
(Amigo) – Qual teu motivo? Achou outro amor?
(Prisco) – Outro? Não entendo. Outro amor nunca tive.
(Amigo) – E enquanto a filha dos Boleno?
(Prisco) – Cosia de pele... eu já te disse.
(Amigo) – Mas diga lá, quem foi que achaste?
(Prisco) – A senhora augusta de meu coração!
(Prisco) – Cujo símbolo amado é o punho, a mão
(Prisco) – Fechada ela estava, e abriu-se a ela...
(Prisco) – Ascendeu-se esta vela no calabouço...
(Amigo) – Mão? Calabouço? Vela? Bebeste?
(Prisco) – Esqueça cadete... Não vais entender...
(Amigo) –Tente me explicar!
(Prisco) – Em verso... só em verso consigo expressar.
(Prisco) – Essa chama, veemente labareda que me fascina.
(Prisco) – Vem de uma fonte linda... o peito de uma menina...
(Prisco) – Beleza plena, em alma e em medo. E coragem para tê-la. Principalmente.
(Amigo) – Você está drogado... só pode ser.
(Prisco) – Só estou fascinado! De amor de saber!
(Amigo) – Saber? Que saber?
(Prisco) – Saber enrustido. Preso em meu peito, seta de fogo amigo.
(Prisco) – Libertou-me das cordas, soltou as amarras. As vistas... tão claras, serenas, tão lindas!
(Amigo) – Meu caro, piraste! Mas ainda é poeta! E é isso que importa. Preciso falar-te.
(Prisco) – Poeta? É só um título. Isso que é que não importa. Me fale, me conte.
(Amigo) – Os letrados de Lisboa. Leram seu escrito.
(Prisco) – Que notícia boa! E da boca de amigo!
(Amigo) – Pois é, tu tens sorte. É o novo favorito. Lhe exigem em Portugal, serás famoso, meu amigo!
(Prisco) – Eu consegui? Está vivo o meu sonho?
(Amigo) – Vivo e chorando! Recém nascido e pomposo.
(Prisco) – Oh! Que roupa eu ponho?
(Amigo) – Algo bem vistoso.
(Amigo) – São catedráticos e tradicionais. Apreciam o novo, mas só o velho lhes satisfaz.
(Prisco) – Poesia, poesia... poesia dourada. Ela não é vazia e não pode ser categorizada!
(Amigo) – Já conheço esse papo, mas sucesso vai ter! Se aquiete um bocado e o teu nome irá crescer!
(Prisco) – Tudo bem, eu aceito. Para quando é o vôo?
(Amigo) – Não é vôo é navio.
(Prisco) – Por que não avião?
(Amigo) – São excêntricos, amigo.
(Prisco) – Como não... como não...
(Prisco) – Onde me hospedo? Quanto tempo fico?
(Amigo) – Aí que está, se tiveres sucesso, não vais mais voltar.
(Prisco) – Como não? Eu sou livre!
(Amigo) – Claro que é! E pobre também.
(Prisco) – Isso não me convém...
(Amigo) – Vou bater-te! Não me obrigue!
(Prisco) – Como posso partir? Essa é minha terra!
(Amigo) – Nunca gostou daqui. De viver nessa guerra!
(Prisco) – Mas achei minha paz...
(Amigo) – De novo esse papo?
(Prisco) – Eu a amo, rapaz!
(Amigo) – É só paixão, só estado!
(Prisco) – Não é simples estado! Eu a amo de fato!
(Prisco) – Não é passageiro, nem papo, eu a amo, idolatro!
(Amigo) – O que achas que isto aqui significa? É um teatro, uma comédia, é passageiro! No palco tudo passa e nada fica! É assim que vai e some o mundo inteiro!
(Amigo) – Segunda, parte o teu barco.Até lá, terás de escolher.
(Amigo) – Perseguir seu sonho do outro lado, ou buscar teu amor e nessa guerra viver.
(Amigo) – Mas eu digo, amigo, escolhas bem! É uma chance única e muito grande!
(Amigo) – Aquilo que tens hoje, amanhã não tem! E a cada dia teu sonho está mais distante...
(Prisco) – Viver, eu, de poesia... mas sem ela?
(Prisco) – Como posso deixar um sentimento...
(Prisco) – Que bem rápido matou o meu tormento?
(Prisco) – Devo eu lançar-me ao mar e fechar a cela?...

*Fim da cena 02*

Matheus Santos Rodrigues Silva

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